Juizados Especiais Cíveis: Justiça com Agilidade?
Os Juizados Especiais Cíveis, criados pela Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, representam uma resposta normativa à necessidade de ampliar o acesso à justiça no Brasil, especialmente para a população de menor poder aquisitivo e em demandas de baixa complexidade. Inseridos no contexto de efetivação do princípio constitucional do amplo acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CF), esses juizados operam com um rito próprio, baseado em princípios que visam à simplificação processual, à celeridade e à efetividade da prestação jurisdicional.
A competência dos Juizados Especiais Cíveis está delimitada às causas cujo valor não exceda 40 salários mínimos, desde que não envolvam matérias de maior complexidade, como questões de natureza alimentar, falimentar, fiscal ou relativas ao Estado. O legislador optou por excluir da competência desses juizados temas que, pela sua natureza, exigem um rito mais formal ou envolvem interesses públicos relevantes.
A Lei 9.099/95 estrutura um microssistema processual próprio, fundado em cinco princípios fundamentais: oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade. Esses princípios informam toda a dinâmica dos Juizados e representam uma tentativa deliberada de romper com o formalismo do processo civil tradicional. Como observa Fredie Didier Jr. (2023), trata-se de um modelo processual alternativo, que visa à racionalização da atividade jurisdicional, sem prejuízo das garantias fundamentais do processo justo. Ainda que com menos etapas procedimentais e uma estrutura mais simples, o processo nos Juizados deve manter os elementos essenciais do contraditório e da ampla defesa, sob pena de desvirtuamento do próprio instituto.
Uma das particularidades mais marcantes dos Juizados é a possibilidade de o cidadão ingressar com ações sem a necessidade de representação por advogado, quando o valor da causa não exceder 20 salários mínimos. Essa regra, embora favoreça o acesso imediato à Justiça, desperta debates sobre a adequada defesa técnica e a isonomia processual. A concentração da instrução e do julgamento em audiência una, a possibilidade de conciliação desde o início do processo e a simplificação dos meios de prova são características que evidenciam a busca por um processo mais eficiente.
Ao ser comparado com o procedimento comum do Código de Processo Civil, o rito dos Juizados revela diferenças substanciais. A estrutura simplificada, o número restrito de recursos — com destaque para o recurso inominado — e a atuação das Turmas Recursais em substituição aos Tribunais de Justiça criam um modelo autônomo, mais célere, mas que levanta dúvidas quanto à uniformização da jurisprudência e ao controle das decisões. Humberto Theodoro Júnior (2019) adverte que o sistema dos Juizados deve ser constantemente aperfeiçoado para evitar que a celeridade comprometa a segurança jurídica, sob pena de se converter em uma “justiça sumária”, com sacrifício das garantias fundamentais do processo.
Não obstante os avanços trazidos pela Lei 9.099/95, o modelo dos Juizados Especiais Cíveis enfrenta críticas importantes. A primeira delas diz respeito à desigualdade de tratamento entre as causas que tramitam nesse sistema e aquelas submetidas ao procedimento comum. Em muitos casos, a simplificação procedimental implica também em menor rigor na fundamentação das decisões e restrições ao duplo grau de jurisdição, o que pode comprometer a efetividade da tutela jurisdicional. Ademais, a estrutura precária dos Juizados em diversas regiões do país, associada à sobrecarga de processos e à ausência de investimentos, limita a concretização dos objetivos originais da lei.
Outro ponto sensível está relacionado ao papel da conciliação. Embora essencial à filosofia dos Juizados, a conciliação, em certos contextos, pode ser incentivada de maneira inadequada, com pressões indevidas sobre as partes, sobretudo aquelas em condição de vulnerabilidade. O equilíbrio entre solução consensual e respeito aos direitos subjetivos deve ser observado com rigor, a fim de evitar distorções.
Em conclusão, os Juizados Especiais Cíveis constituem um instrumento relevante para a efetivação do acesso à justiça e para a racionalização do sistema processual brasileiro. No entanto, sua consolidação depende de investimentos institucionais, de qualificação dos seus operadores e de um controle jurisdicional que não abra mão da segurança jurídica em nome da celeridade. Como pontua Fredie Didier Jr. (2023), a efetividade da justiça pressupõe não apenas rapidez, mas também legitimidade e qualidade da decisão judicial. É nesse ponto de equilíbrio que o sistema dos Juizados deve buscar sua plena realização.