O princípio da preservação da empresa e seu aspecto essencial na Recuperação Judicial

Por Publicado em: 30 de janeiro de 2025Categorias: Análise

A Lei de Recuperação Judicial e Falências (Lei 11.101/2005) estabelece como um de seus objetivos centrais a preservação da empresa em crise, priorizando sua continuidade em detrimento da liquidação imediata de ativos. Nesse contexto, a tensão entre os direitos de credores e a sobrevivência empresarial ganha destaque, sendo sopesada especialmente quando bens essenciais à atividade produtiva estão em discussão. É a partir dessa dicotomia que o Tribunal de Justiça de Goiás analisou o Agravo Interno de nº 6124740-95.2024.8.09.0183, reforçando a aplicação do princípio da preservação da empresa como diretriz prioritária em processos de recuperação judicial.

Contexto do Caso

Os Agravantes, produtores rurais em recuperação judicial, permitido pela alteração legislativa, buscaram suspender leilões extrajudiciais de três imóveis rurais (matrículas 7.679, 7.684 e 7.692), marcados para janeiro de 2025. Essas propriedades, vinculadas a créditos fiduciários do Banco Original S.A. e da Caixa Econômica Federal, são utilizadas para o cultivo de soja, cuja colheita é prevista para fevereiro/2025 e criação de gado, essenciais para preservação da sociedade. A decisão inicial indeferiu o pedido de suspensão, sob o argumento de que o prazo para consolidação de créditos já havia expirado.

Fundamentação da Decisão

O Desembargador, relator do caso, reformou a decisão liminar e suspendeu os leilões, baseando-se em três pilares:

  • Princípio da Preservação da Empresa (Art. 47 da Lei 11.101/2005):

A finalidade da recuperação judicial é viabilizar a superação da crise econômica, mantendo a fonte produtiva, empregos e a geração de riqueza. A alienação dos imóveis, essenciais à atividade agrícola, inviabilizaria a colheita e a continuidade operacional, frustrando o objetivo legal o acarretaria na falência dos produtores rurais.

  • Jurisprudência do STJ:

Precedentes como o AREsp 1.677.661/SC e o AREsp 1.087.323/SP admitem exceções à exclusão de créditos fiduciários quando os bens garantidores são indispensáveis à atividade produtiva. O STJ entende que a primazia da garantia real não pode subverter o princípio da preservação da empresa.

  • Risco de Dano Irreparável:

A iminência do leilão (janeiro/2025) e a dependência dos imóveis para a safra de soja e a criação do configuraram risco concreto de prejuízo irreversível. Já a fumaça do bom direito foi

reconhecida pela comprovação da essencialidade dos bens, atestada em relatório da administração judicial.

Impactos da Decisão

A decisão reforça que o art. 49, §3º da Lei 11.101/2005 não é absoluto. Ao suspender a alienação fiduciária de imóveis rurais, sinalizando que:

  • Bens essenciais têm proteção diferenciada: a terra, no caso da sociedade em recuperação se pautar no agronegócio, não pode ser tratada como mera garantia, mas como elemento essencial para a recuperação;
  • Equilíbrio entre credores e devedores: A segurança jurídica dos credores fiduciários cede espaço ao interesse social na manutenção da empresa e de suas externalidades;

Contudo, pode gerar impactos na segurança jurídica, pois há uma alteração de previsão legal, e pode desproteger credores fiduciários.

Conclusão

O caso reflete a dicotomia entre garantias reais e políticas de recuperação empresarial. Ao priorizar a preservação da empresa, a decisão alinha-se à função social do direito empresarial, que busca harmonizar interesses econômicos e coletivos, conforme atual análise da Lei de Falências.

Sobre esse ponto, é certo que os tribunais pátrios deverão debruçar-se sobre critérios objetivos para definir a “essencialidade” de bens, garantindo previsibilidade sem sacrificar a sobrevivência empresarial. Em casos como este, o princípio da preservação da empresa deve ser ponderado com rigor, principalmente quando a alienação de ativos ameaça a viabilidade de uma sociedade em recuperação e o equilíbrio entre o pagamento de credores e a continuidade da atividade econômica.

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