Por que os filhos do apresentador Gugu Liberato foram parar na Justiça por conta da herança deixada pelo pai?

Por Publicado em: 26 de junho de 2023Categorias: Análise

Desde que foi iniciado o inventário do apresentador Augusto Liberato (o “Gugu”), falecido em 2019, os seus filhos estão sob os holofotes da imprensa brasileira1. Estima-se que a herança do apresentador é na ordem de R$1 bilhão de reais e, desde 2019, os descendentes travam uma verdadeira disputa judicial para partilhar os bens deixados por Gugu.

Noticia-se que os filhos do apresentador, João, Marina e Sofia, todos maiores e capazes, foram concebidos pelo método da cessão temporária de útero, popularmente conhecido por “barriga de aluguel”, e a genitora é a Sra. Rose Miriam di Matteo, que também se mantém sob os olhares atentos da imprensa, desde o falecimento do apresentador.

O imbróglio em torno da transmissão da herança está no fato de Gugu ter deixado testamento no qual dispôs a sua parte disponível (metade da herança) da seguinte forma: 75% (setenta e cinco por cento) para os 03 (três) filhos e 25 % (vinte e cinco por cento) para 05 (cinco) sobrinhos. Rose Miriam, a genitora dos filhos do apresentador, não concordando com a disposição do testamento, reivindica o reconhecimento de união estável com Gugu e, como tal, a sua parte na herança. Em paralelo, também entrou em destaque o requerimento do Chef Thiago Salvático, que noticia existência de uma relação estável com o apresentador.

Como se vê, são variados os interesses dos personagens desse imbróglio. Notadamente, as partes interessadas pretenderam ingressar em juízo para buscar a solução dos impasses e a discussão se arrasta desde 2019 no Judiciário brasileiro.

Até aqui, o que se teve foi a postulação e início da fase instrutória na ação de reconhecimento de união estável de Gugu e Rose Miriam, somado à postulação e decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo na ação de reconhecimento de união estável de Gugu e Thiago. Nesta última, o Tribunal entendeu que os dois tinham uma relação que se caracterizaria como “amizade” e foi noticiado que Thiago recorre dessa decisão e o julgamento do recurso está pendente.

Na semana passada, foi veiculado na imprensa nacional trechos de uma ata de audiência, datada de 20/09/2021, que transcreveu calorosa discussão entre os filhos de Gugu, seus respectivos advogados e os advogados que representavam Rose Miriam2. Muito provavelmente, essa ata dizia respeito à audiência de instrução realizada nos autos da ação de reconhecimento de união estável de Gugu e Rose Miriam, que tramita em segredo de justiça. De uma maneira geral, conclui-se que os filhos divergem quando o assunto é a existência ou não de união estável dos pais. O filho João defende que os pais não tiveram união estável, mas as filhas convergem no entendimento de que os pais tiveram relacionamento estável.

Em um dos trechos da transcrição da ata, a filha Marina afirma que os pais tiveram uma união estável e um dos advogados a questiona: “Tiveram? …(incompreensível)…união estável ficta.”. Na sequência, é possível perceber que Marina pergunta “Quais são todas as condições de união estável? Me digam. (…) O que você precisa ter pra ter uma união estável? (…) Uma relação pública. Correto. O que mais?” e o advogado responde “Muito mais do que sua mãe teve. (…) Há obrigação conjugais, como se fosse marido e mulher, uma delas é manter relações sexuais, é uma delas.”.

De acordo com a lei brasileira vigente, a definição de união estável apresentada necessita de claros ajustes. Tecnicamente, de acordo com o art. 1.723, do Código Civil3, uma entidade familiar é reconhecida como união estável quando houver convivência pública dos membros, a relação for contínuaduradoura e com o objetivo de constituição de família.

Posta a questão nesses termos, a jurisprudência brasileira – conjunto de julgados sobre um mesmo tema – vem considerando relevantes outros elementos de prova, que, quando em conjunto, auxiliam no convencimento da existência ou não de união estável. São alguns exemplos:

1) a coabitação – a simples coabitação não é suficiente para o reconhecimento da união estável, mas, quando presente, demonstra semelhança à vida de casado;

2) divisão dos ônus e bônus da vida em comum – o compartilhamento de tarefas domésticas, separação de responsabilidades no pagamento das despesas da casa, dos gastos com eventuais filhos, pets, etc., são exemplos do esforço de um casal que vive uma vida à dois;

3) esforço comum no aumento do patrimônio do casal;

4) convívio social, existindo comunhão de interesses e afetos; e

5) existência de contas bancárias conjuntas, planos de saúde em comum e informação do título de dependente perante órgãos públicos.

Notadamente, ao decidir sobre o tema, o julgador deverá se ater ao conjunto probatório dos autos e isso fica bem claro quando se analisa os fundamentos dos julgados4. Os mais comuns instrumentos de prova são: documentos, fotos, vídeos, depoimento das partes do processo e suas testemunhas, estudo técnico e perícia.

Como se percebe, os requisitos para constituição de união estável são amplos e demandam – muitas vezes – arrastada instrução. É o que ocorre no caso envolvendo o apresentador Gugu. A existência de união estável com a genitora de seus filhos ou com o Chef Thiago precisa de prova, para que os Juízes das causas tenham convicção dos fatos e profiram decisão alinhada à realidade que o apresentador vivia.

Por Lívia Ribeiro Alves dos Santos.

 

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Fonte:

(1) Revista Quem. Disponível aqui.

Monitor do Mercado. Disponível aqui.

O Tempo. Disponível aqui.

R7. Disponível aqui.

JM Online. Disponível aqui.

(2) Revista Veja. Disponível aqui.

(3) Lei nº 10.406/2022 (Código Civil).

(4) TJMG; Apelação Cível 1.0000.23.061928-0/001, Relator(a): Des.(a) Francisco Ricardo Sales Costa (JD Convocado), Câmara Justiça 4.0 – Especiali, julgamento em 26/05/2023, publicação da súmula em 26/05/2023

TJMG; Apelação Cível 1.0000.23.036147-9/001, Relator(a): Des.(a) Alice Birchal, 4ª Câmara Cível Especializada, julgamento em 26/05/2023, publicação da súmula em 29/05/2023

TJMG; Apelação Cível 1.0411.18.000359-1/001, Relator(a): Des.(a) Paulo Rogério de Souza Abrantes (JD Convocado), 4ª Câmara Cível Especializada, julgamento em 25/05/2023, publicação da súmula em 29/05/2023

TJMG; Apelação Cível 1.0000.23.014101-2/001, Relator(a): Des.(a) Alice Birchal, 4ª Câmara Cível Especializada, julgamento em 25/05/2023, publicação da súmula em 29/05/2023

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Pós-Graduada em Direito Processual Civil e Métodos Alternativos de Resolução de Conflitos na PUC/Minas (2019) e Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos (2017) com especialização nos cursos de Capacitação em Mediação Extrajudicial na D’Accord – Instituto de Capacitação e Treinamento em Mediação e Gestão de Conflitos (2º/2021) e Capacitação em Mediação na CAMARB – Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial-Brasil (2016).

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