A solução consensual das controvérsias e a nova realidade mundial

Por Publicado em: 22 de junho de 2020Categorias: Notícias

A solução consensual das controvérsias e a nova realidade mundial

 

por Lívia Ribeiro Alves dos Santos

 

A solução consensual das controvérsias, tal como a autocomposição, a conciliação e a mediação, é prática costumeira nas sociedades, com origens em tempos antigos, porém, precisou ganhar uma nova “roupagem” para se adequar aos tempos modernos e atender aos anseios contemporâneos.

Somado a essa necessidade, o ordenamento jurídico brasileiro cuidou de regular um novo caminho para tutelar o direito do cidadão, com um novo olhar sobre o conflito, harmonizando um sistema processual com as garantias constitucionais de um Estado Democrático de Direito. Nesse sentido, o Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015) se destinou, entre outros aspectos, a disciplinar tanto a atividade judicial quanto os meios de solução consensual de controvérsias.

Quanto a esse aspecto, confira-se a disposição literal do artigo 165, do CPC/2015:

Art. 165. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.

§ 1º A composição e a organização dos centros serão definidas pelo respectivo tribunal, observadas as normas do Conselho Nacional de Justiça.

§ 2º O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.

§ 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.

Veja-se, então, que o pontapé inicial foi dado, em que pese o Brasil ter hoje não apenas métodos de soluções consensuais na seara judicial, mas também na seara extrajudicial, seja por meio de profissionais “ad-hoc”, seja por meio de câmaras privadas de conciliação e mediação, inscritas em cadastro nacional e em cadastro de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal.

Independentemente das vertentes que se utiliza, judicial ou extrajudicial, fato é que, os métodos de soluções consensuais são valiosos instrumentos de pacificação social, pois as partes constroem conjuntamente a solução do conflito, de modo que não há ganhadores ou perdedores.

Muitos são aqueles que disseminam a importância da autocomposição, da conciliação e da mediação, já conseguem aplicar o método com os seus clientes e são remunerados como tal. Entretanto, ainda é grande a parcela de profissionais que apresentam resistência a esse método.

Em dias difíceis como os de hoje, com o avanço do contágio do COVID-19 (Coronavírus) – doença causada por um vírus que pode levar a morte – os métodos consensuais de solução de conflitos enxergam outro possível obstáculo, o isolamento social. O isolamento social vem sendo divulgado pelos órgãos mundiais de saúde como o meio mais assertivo para a contenção da disseminação da doença entre os seres humanos. Logo, poder-se-ia pensar: e agora, como conciliar o isolamento social com a mediação e a conciliação?

A bem da verdade, sem que se faça juízo de valor a esse respeito, as medidas de isolamento social estão impactando o curso dos processos e o atendimento aos jurisdicionados que buscam o Judiciário para resolver seus conflitos. Além disso, a Justiça já vinha dando sinais de crise, pois temos um sistema cada vez mais sobrecarregado e a morosidade dos processos e a burocratização da justiça é uma realidade que traz limitações ao exercício da função jurisdicional do Poder Judiciário e podem acabar por incentivar a litigiosidade e explodir ainda mais os conflitos sociais.

Porém, esse momento de crise trazido também pelo COVID-19, veio potencializar a reflexão no Brasil acerca da disponibilização das plataformas de resolução de conflitos online, tal como já ocorre em cortes norte-americanas, e já se nota a adoção de algumas ações a esse respeito.

O Conselho Federal da OAB, atento ao importante papel do advogado na mediação e conciliação, publicou o Provimento 196/2020, reconhecendo a atividade daqueles profissionais que atuam como mediadores, conciliadores, árbitros ou pareceristas.

Passo seguinte, o Tribunal Superior do Trabalho editou recomendação (Recomendação CSJT.GVP no 01/2020) com diretrizes excepcionais para que a mediação e conciliações sejam feitas por videoconferência. Essa medida passará ser adotada visando evitar o contágio do COVID-19 e darão total apoio para os métodos consensuais em conflitos individuais e coletivos nas fases pré-processual e processual por meio eletrônico e videoconferência.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro também já estuda a adoção de medidas para implantar a ODR (online dispute resolution) em seus procedimentos.

Certamente, outros Tribunais também seguirão esses passos nas próximas semanas e estaremos atentos aos próximos acontecimentos.

Sem dúvida, a disponibilização de plataformas de videoconferência e demais tecnologias de informação e comunicação para realização das sessões de mediação e conciliação constitui uma forma direta e eficiente de garantir o acesso à justiça, reduzindo custos e evitando deslocamentos desnecessários pelos usuários.


Lívia Ribeiro Alves dos Santos é graduada em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos, pós-graduanda em Direito Processual Civil e Métodos Alternativos de Resolução de Conflitos pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, membro do Grupo de Estudos em Mediação Empresarial do Comitê Brasileiro de Arbitragem e advogada no escritório Suzana Cremasco Advocacia.
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